Cirurgia adiada. Mais uma vez.

Nada acontece por acaso. A última semana esse foi meu mantra e eu o repeti praticamente todos os dias. Sem cansaço. Uma forma de continuar a seguir e tentar me recuperar da perda e da partida da minha avó. 

Eu estava focada na minha cirurgia para o tratamento do meu aneurisma cerebral, que seria hoje, dia 15 de março. Passei a semana mal, triste, sem rumo, chorando . E pensar que passaria pela craniotomia neste momento me assustava um pouco. Mas também me parecia um escape. Eu já aguardava por essa data há um tempo. Recebi o diagnóstico do aneurisma em agosto, fiz em novembro o exame de imagem que determinou qual o método adequado de cirurgia ( e a torcida era para que a cirurgia fosse realizada no mesmo dia, mas não foi possível). E então passei a esperar por fevereiro, que era quando eles haviam previsto que o procedimento real aconteceria.

Iria para o hospital na segunda bem cedinho. Passaria pela cirurgia e após o procedimento ficaria na UTI até o dia seguinte. Depois seria encaminhada para o quarto, onde ficaria por mais uns 5 dias, recebendo diariamente a visita do Kimmo e da Cecília, apenas possível por ela ainda mamar (qualquer outra visita não é permitida no momento, devido ao coronavírus). 

Confesso que a perspectiva de ficar essa semana no hospital, me recuperando da craniotomia havia me acalmado um pouco. Eu poderia ter meu tempo para mim. Para não só me recuperar do procedimento físico, mas também da partida da minha avó. Eu precisava desse tempo para mim. Sem preocupações com cuidar da casa, sem trabalhar, sem estudar finlandês, sem cuidar da Cecília. Um tempo de luto, de tristeza. Pois essa última semana eu fui um fragmento de mim mesma. O que eu sei ser completamente normal. Mas mesmo normal, é muito difícil tentar dar atenção a um bebê de 1 ano que quer brincar, quer interação e quer carinho. Quando as vezes olhar para ela me fazia chorar ainda mais. 

Era um momento para mim que eu poderia tirar sem culpa. Mas semana passada, após tudo certo, após conversar e confirmar tudo com a enfermeira e receber as instruções todas, o hospital me ligou informando que minha cirurgia tinha sido adiada. 

Senti como um grande golpe. Em cima do luto que estava passando. Sem chance de tirar esse tempo de recuperação. Sem chance de ter uma "desculpa" para não fazer nada e apenas deixar o tempo fazer o que faz de melhor, passar e tornar essa ferida menor. 

Depois do baque e da explicação para o adiamento, compreendi que "nada acontece por acaso". Um paciente com uma necessidade muito maior (um tumor cerebral) necessitava de atendimento e devido ao COVID-19 os recursos atuais da neuro cirurgia não permitiam que o departamento lidasse com emergência e casos agendados. Então minha cirurgia foi adiada para daqui a uns meses. 

Saber tudo isso não apagou meu sentimento de decepção, mas fez com que eu compreendesse que era melhor assim. E que talvez o melhor agora seja mesmo eu focar em retomar a vida aos poucos, abraçar o luto também e não estar sozinha.